quinta-feira, 19 de novembro de 2009

"Um homem vai ao cassino, ganha um milhão, volta para casa e se suicida".

Ele não teve coragem de dar qualquer telefonema, pensou seriamente para quem ligar e contar o absurdo dos fatos. Impossível! Tanto os amigos, quanto os filhos e parentes não entenderiam. Assim como ele não entende e está, até agora, perfléxo.

Caminhar as onze quadras, completamente desnorteado, não aliviou as dores no corpo. Dispensar segurança, motorista, governanta, cozinheira, copeira, passadeira, costureira, alfaiate, personal stile, personal trainner e jardineiro não aliviou as dores na alma. Nem a solidão.

Sentado na poltrona da esquerda, da ampla sala norte, sem qualquer som e apenas luzes indiretas, pensava no acontecido. Pensava no Iate atracado na costa de Malibu, no apartamento com vista para o Arco do Triunfo, do quinto andar inteiro na Vieira Souto, no lar fazenda do Uruguai, na filha e os dois netos na Inglaterra, no filho surfando entre a Autrália, Bali e Nova Zelandia e na esposa, amada esposa, descansando em paz. Tudo tão distante.

E nada ajudava ele a entender os fatos. Como aquele AS de Espadas poderia virar o jogo? Como todos os demais estavam blefando? Como ele não percebeu? Como ele teve coragem de apostar tudo? Como os demais também tiveram coragem? E principalmente, tão somente, como ele poderia ter ganho, em minutos, o triplo de um ano de renda fácil.

Ficou pensando na cifra absurda, no primeiro milhão aos vinte e quatro anos, na lista da Forbes aos vinte e oito e agora, com cinquenta e três, na tranquilidade em ser rico, ter tudo e ainda contar como a mesma sorte do principiante. Sorte não existe, o que existe é trabalho, mas qual é o conceito do jogo? Faltava apenas ser feliz e útil. A sensação era de já ter encarado todos os desafios e ter ganho todos eles, menos o maior desafio da vida: o de ser feliz.

Realmente o que ele ouvia quando criança, no interiro de Uruguaiana, era a mais pura verdade, o dinheiro facilita a felicidade, mas não traz. E não trouxe mesmo e nem fez feliz e nem ajudou e nem foi útil e perdeu o sentido e desejou morrer, mas só por aquela noite. Amanhã fará tudo diferente!
Se ele não é útil seu dinheiro será!
Desta vez será e fará feliz!
Novos planos e nova vida, mas só depois de morrer.

Temperar a vida com a morte nossa de cada dia.